II COE - V Desafio
Texto vencedor por Marianne:

Encontrei Deus numa tarde de chuva. Combinámos o encontro uns dias antes e Deus foi pontual. Imaginava-O de outra forma. Imaginava-O mais velho, mais grisalho, mais marcado por milénios de existência. Percebi rapidamente que andei a vida inteira iludida com imagens baseadas em coisa nenhuma. Apesar de ser diferente do que eu imaginei, a serenidade com que me recebeu foi a mesma que fui ensinada a reconhecer-Lhe.
Mantive-me de pé à Sua frente, mais por não saber o que fazer do que por respeito ou medo. Acolheu-me num abraço silencioso, de carinho e empatia. Pediu-me que me sentasse e que perguntasse o que quisesse.
- Se Deus é bom, como é possível que haja tantas coisas más no mundo?
- Rejo-me por um princípio bastante simples: apenas experimentando o mau se pode apreciar o bom. O mundo não será nunca um paraíso isento de maldade. As pessoas não são todas boas e nisso eu não interfiro. Limito-me a aceder a alguns pedidos. Não a todos, porque há pedidos que não fazem sentido. Existem guerras porque as pessoas as fazem. Há quem mate e quem morra e sempre foi assim. Imagina um mundo sem morte. Insustentável, não te parece?
- Porque é que permites que morram crianças?
- Quem julgas tu que ensinou a Lavoisier que nada se cria, nada se perde, tudo se transforma? Há crianças que morrem porque precisam de morrer. Algumas para ensinar os pais a lidar com coisas maiores do que eles. Outras porque estão destinadas a regressar a algo ainda maior. Todas voltam a viver, não te preocupes.
- Porque é que nem todos os criminosos pagam pelos crimes que cometem?
- Tal como é insustentável que exista um mundo sem morte, também é impossível que haja um mundo sem crimes. Porque os crimes são cometidos contra alguém e esse alguém acaba a chamar por mim. Um mundo sem maldade, sem crimes e sem morte é um mundo onde Deus não é necessário.
- Perdoas-nos?
- Perdoo. Mataram-te porque algo pior estava a matar-te. Acabarias junto a mim, fosse de que forma fosse. Não ias morrer sozinha e pediste ajuda. Quem te amava ajudou-te a morrer porque estás melhor assim. Subiste ao céu, vieste para junto do Pai, tal como te ensinaram. O teu destino era este: ser morta por quem te deu vida. Hás-de voltar para eles. Nada se cria, nada se perde...