II COE - I Desafio
Texto vencedor por Marianne:

A porta abria-se devagar, não entrava luz. Tinhas sempre cuidado para que eu não desse por ti. Sentavas-te aos pés da minha cama, fazias-me festas no cabelo. Eu não chegava a adormecer profundamente porque sabia que havias de ir ao pé de mim. Fazias o mesmo todas as noites. Mal ouvia a tua respiração e tentava que não ouvisses a minha. Entrelaçavas os dedos no meu cabelo, passavas-me a mão na testa, nas bochechas e nos lábios. Ouvia o roçagar do tecido. Punhas a mão dentro das calças do pijama e tocavas-te enquanto, com a outra mão, me afagavas o cabelo. Sentia-me encolher como um caracol na casca, mas não me mexia. Depois ajoelhavas-te à minha frente, duro, enorme, continuavas a tocar-te e chegavas a ponta do pénis aos meus lábios. Eu fingia dormir. Puxavas-me o queixo para baixo e abrias-me a boca, que logo preenchias com aquela parte de ti. Agarravas-me o cabelo com mais força e fazias tu os movimentos de que precisavas para gostar daquele momento, que repetias todos os dias. Quando terminavas limpavas o que houvesse a limpar, davas-me um beijo na testa, ajeitavas-me os lençóis e dizias baixinho “até amanhã”. Eu encharcava a almofada com lágrimas que não sabia porque me corriam pela cara.
De manhã acordavas-me com beijos, atiravas-me ao ar, tratavas de mim. Dizias que me amavas e partias feliz.
Eu não entendia. Aos cinco anos não se entendem rituais que não nos explicam. Não se sabe que um pai não pode fazer isto a um filho. Não se sabe que é errado, mas sente-se que algo não bate certo. Eu não sabia. Odiava cada momento desde que me deitava até que acordava na manhã seguinte, mas não sabia porquê. Cresci. Comecei a entender. E a odiar tudo em ti. Foste o pai que me violou. Que me obrigou a fazer coisas que não percebia mas que agora sei quão doentias são. Odeio que pensasses que não me fazias mal nenhum. Odeio que me usasses para teu prazer. Eu, que era teu filho e tinha apenas cinco anos, acolhia na boca toda a tua insanidade, noite após noite. Odeio que vivas. Que sejas meu pai. Odeio que tenhas pensado que podias usar-me para ter o prazer que não conseguias em mais lado nenhum. Foi por isso que hoje, 20 de Março de 2012, te matei com um tiro no coração.